Depois de saber que está a decorrer um processo que pode envolver a regularização/legalização da actividade de exploração de inertes na freguesia de Almoster, Alvaiázere, decidi que seria importante debater esta questão. Faço-o por vários motivos, em primeiro lugar porque é uma questão que deve ser debatida publicamente. A população deve ser envolvida neste debate e saber toda a informação possível, de modo a poder dar o seu contributo e decidir (sim, a população tem poder de decisão). Em segundo lugar estou saturado de ouvir o pseudo argumento do costume por parte de empresas do ramo em causa. Acenam com os postos de trabalho sem, contudo, dizer o que é importante todos saberem.
Trata-se de um projecto que envolve a exploração de saibro e areia, numa área de oito hectares (oito campos de futebol...). Trata-se, portanto, de um grande impacto ambiental/paisagístico naquela freguesia e de postos de trabalho que nada acrescentam aquele território. Não se tratam de postos de trabalho que acrescentem valor ao território e que retirem dali as mais valias do mesmo. Retiram sim valor ao território e é isso que as pessoas precisam de saber, para depois, e em consciência, decidir. Resta saber o que a população prefere ter, empregos estáveis e duradouros, que valorizem o território ou empregos a prazo que degradem o território.
Não me espanta este projecto, ainda mais sabendo que o PDM está em revisão e uma das hipóteses em cima da mesa é tornar esta área de REN uma área sem condicionantes à exploração de inertes, facto que não é ordenamento do território mas sim uma mera desclassificação de uma área com mais valias ambientais para uma área de exploração de inertes, com o inerente passivo ambiental.
Depois de ler alguma documentação, fiquei algo surpreendido com o facto de se estar a utilizar este projecto como que um "seguro" para uma outra exploração (pedreira). É algo que me preocupa seriamente, pois um projecto que utiliza este argumento demonstra uma fragilidade importante. Já não fiquei surpreendido em ler a argumentação da empresa em causa, populada por demagogia e populismo. E quanto ao texto do documento em causa, nem se fala, pois utiliza nuns parágrafos o "acordo" ortográfico e noutros não o utiliza (e bem). Há também erros ortográficos de realce, como o "impato".
Voltando à questão, a empresa em causa utiliza uma argumentação onde refere os impactos positivos da exploração, sem dizer objectivamente quais são e como são, omitindo contudo os impactos negativos, talvez pelo facto de não ser conveniente em termos de imagem para a população. Em vez de se centrar neste projecto, está continuamente a referir
a sua outra exploração, abordando o cumprimento de normativos de segurança e saúde no que respeita aos colaboradores, mas esquecendo aqueles que vivem em redor desta exploração.
O documento que li tem muito daquilo a que denominamos como "palha". Quando seria por exemplo de esperar que se falasse numa suposta obtenção de declaração de interesse público, surge apenas "consequências da não obtenção de declaração de interesse público". Em vez de se falar nos impactos ambientais da exploração, tal como é suposto, fala-se nos custos sociais e económicos da não exploração da "pedreira". É, portanto, uma narrativa parcial, algo que deve ser devidamente apontado. Se há formas de criar empregos duradouros e que não impliquem a destruição e degradação de partes do território, porque devemos nós aceitar esta demagogia de uma empresa num documento que deveria ser imparcial? Porque é que tem de ser o interesse de uma empresa a impor-se ao interesse público? Deverá esta exploração ser reconhecida como do interesse público, sem que exista debate público? Porque não há debate sobre este suposto interesse público?
E que tal promover-se um debate público, sem estereótipos e populismos sobre este projecto? Em democracia é natural que isso aconteça. E porque é que a Junta de Freguesia de Almoster não promove um debate, já que o projecto é relativo à sua freguesia? É certo que o actual presidente da junta de freguesia
não é o mais competente para se envolver em questões ambientais, mas mesmo assim tem essa obrigação.
Há uns dias introduzi a questão num grupo do facebook de Almoster. Inicialmente a reacção de uma ou duas pessoas foi de apoio ao projecto, contudo, e depois de eu desenvolver a questão, as reacções foram diferentes. As pessoas começaram a estranhar não saberem nada de concreto sobre o projecto e não saberem nada sobre a dimensão do mesmo ou das consequências e impactos ambientais. (não conheço nenhum estudo de impacto ou incidências ambientais, tal como seria de esperar...). Começaram a fazer perguntas, algo que será sem dúvida incómodo para a empresa em causa, mas que é de salutar em termos de cidadania activa e uma democracia que se pretende sã.
Ou seja, eu dei o tiro de partida, esperando agora que o debate prossiga...