É daquelas fotografias que falam por si. Há momentos que gosto de registar para a posterioridade e, por vezes, utilizar em alguns dos meus comentários aqui pelo azinheiragate.
Não me admira que o (muito) que resta desta carroça esteja brevemente ali num qualquer jardim de uma casa, como que se de um troféu se tratasse. São vários os exemplos de objectos como este que populam os jardins das casas de pessoas que pensam que, assim, dignificam o objecto em causa, que pensam que a utilidade dele é estar ali parado, sem utilização, à chuva, à espera que aquele do dia em que já não sirva sequer para mostra pseudo-etnográfica e siga para lareira.
Quantos são aqueles que pegam nesta carroça e a recuperam, dando-lhe utilidade, embora não a utilidade circense que, por vezes, se vê? Quantos são aqueles que a recuperam e a utilizam, nem que seja alguns fins de semana, com os familiares? Claro que isto significa que é preciso o burrico para puxar a carroça, mas estou apenas a desconstruir uma realidade e a construir uma outra. Sim, isto é possível, no entanto o pessoal contenta-se com a memória do objecto, daí a lógica do objecto no jardim à frente da casa, para toda a gente ver. Eu só me contento com a recuperação da carroça, com a vinda do burrico, com o regresso à terra e aproveitamento dos terrenos abandonados. Viver com calma e qualidade de vida é o mais importante.
Já repararam como daquelas coisas que até gostamos de pensar que queremos fazer, raríssimas são aquelas as que levamos à prática? Somos levados por uma sociedade formatada, onde o comprar, comprar e comprar é que conta, onde a lógica do pseudo-desenvolvimento surge pelo consumismo e só se avança se se consumir mais e mais. É um modelo esgotado que continuamos cegamente a seguir, muitas vezes não pensando nos factos e nas consequências.
Não pensamos em recuperar nem mesmo em inovar. Há ideias para todos os gostos, desde o recuperar a bela da carroça, comprar o burrico e dar uso à carroça, dignificando o burrico e dando-lhe as devidas condições. Passeios de carroça, asinoterapia, são apenas alguns exemplos mais comuns. Há outras ideias, que assim de repente me lembro, mas pensando melhor, vou guardar a ideia que tive agora mesmo para um projecto a desenvolver nos próximos meses. Um brainstorm apanhou-me desprevenido, confesso...
Voltando à carroça, já pensaram que quanto mais depressa andamos, menos tempo temos para nós e menos felizes somos? Hoje em dia falta algo de essencial, o parar para ponderar calmamente. Uma das melhores coisas que poderíamos fazer ao passar por ali, no local da foto, seria parar e entrar na carroça, que nem máquina do tempo. Sentados ali as ideias fluem de uma outra forma, isso é certo, já pensaram nisso? E que tal um destes dias, ao se depararem com este ou outro objecto etnográfico, pararem ao pé dele? Parem, mexam e sintam a alma do objecto, pois pode ser que fiquem inspirados e comecem a entender que este e outros objectos representam algo de fundamental. Pode ser que também oiçam o grito de revolta que estes objectos desprezados conseguem verbalizar sem que possam sequer falar...
E já que falei em máquina do tempo, já pensaram que a têm mesmo à vossa frente?!
E já que falei em máquina do tempo, já pensaram que a têm mesmo à vossa frente?!
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