13.9.10

Um feroz ataque aos Instrumentos de Gestão Territorial

Será, porventura, um dos comentários do azinheiragate mais relacionados directamente com a minha profissão de geógrafo, já que o Ordenamento do Território é o meu domínio principal. Pelo mesmo facto será um comentário muito incisivo.
É uma temática estruturante para a sociedade e para todos os cidadãos, mesmo que estes não se apercebam do facto. Por isto mesmo é que faço questão de trazer agora um exemplo do quanto lesiva pode ser a acção de um cidadão com responsabilidades na questão dos Instrumentos de Gestão Territorial, nomeadamente do que se refere aos Planos Directores Municipais. Irá ser um comentário duro, mas mantendo sempre a linha de imparcialidade, seriedade e de crítica construtiva pelo qual o azinheiragate se pauta desde o seu início. Falarei também numa linguagem simples, de forma a conseguir fazer a tal ponte entre ciência e sociedade, a qual tem faltado na sociedade portuguesa.
Tendo em conta o que referi, passo a retratar a situação:
Desde que me tornei geógrafo, tenho vindo a aprender muitas coisas importantes (e continuarei aprender, sempre!), algumas das quais desconhecia, outras até as conhecia mas de forma inconsciente. Após alguns anos comecei então a compreender certas coisas que passam ao lado do cidadão comum, algo que me trouxe muitas alegrias, mas também algumas tristezas.
Os Instrumentos de Gestão Territorial, nomeadamente o Plano Director Municipal, são instrumentos que visam gerir da melhor forma um determinado território. Visam dar o melhor uso às diferentes parcelas do território. A base de qualquer actividade é sempre o território, de forma directa ou indirecta (genericamente falando), sendo portanto normal que o processo de planeamento tenha em conta estes e outros aspectos. Só assim se consegue trazer sustentabilidade aos processos de crescimento e desenvolvimento das regiões.
É e sempre será algo que incomoda certos actores de desenvolvimento, alguns dos quais pensam no curto prazo, esquecendo o médio e longo prazo. Este facto é um pormenor de extrema importância que alguns dos actores de desenvolvimento territorial se esquecem, por isso mesmo é que defendo que os autarcas deviam ser obrigados a ter noções básicas de ordenamento do território quando se propõem ficar aos destinos de um município. É uma ideia natural e racional que tem sido esquecida desde sempre.
Normalmente e em grande parte dos casos, os actores de desenvolvimento não têm formação na área das Ciências da Terra, algo que nos dias de hoje é preocupante tendo em conta as exigências cada vez maiores para a gestão de um território. Para gerir há que conhecer!
Muitas vezes acontece que um autarca tem formação em economia, algo que por si não é um problema de fundo, mas que pode vir a ser...
Em 2009 li um dos livros mais importantes no que concerne à economia ecológica (Daly & Farley), escrito por um economista sábio, o qual sabe que é a economia que tem de seguir a base territorial e não o contrário. Neste livro li uma expressão fantástica que se pode aplicar ao que irei referir já a seguir.
Este economista refere algo de importantíssimo, que a maioria dos economistas sabe o preço de tudo mas não sabe o valor de nada. Este facto pode ser muito problemático em regiões de grande valor patrimonial, como é o caso da região de Sicó.
É uma frase profunda, extremamente pertinente que urge reflectir. Infelizmente é uma frase que tem reflexos muito negativos na região de Sicó e, em especial em Alvaiázere.
Digo isto porque Paulo Tito Delgado Morgado tem vindo a demonstrar uma clara iliteracial cultural durante a sua presidência, não dando a necessária à importância do Plano Director Municipal, nem mesmo à Rede Natura 2000. Ao invés, vê estes como adversários à sua gestão, tentando fazer tudo para reverter parte da integridade dos mesmos, abrindo assim caminho aos seus planos futuros.
Há poucas semanas, este autarca mostrou isso mesmo, tentand0 promover alterações parciais a alguns artigos do respectivo PDM. Alterações que em termos concretos fragilizam, no mau sentido, algumas bases fundamentais do PDM, caso da Reserva Ecológica Nacional.
Desde que iniciou as suas funções naquele organismo público, cedo prometeu um PDM de segunda geração, algo que tendo em conta algumas falhas dos de 1ª geração até fazia todo o sentido. Dizia que queria limitar a dispersão de casas e trabalhar nos principais núcleos urbanos, de forma a garantir a segurança das pessoas e bens (incêndios florestais) e diminuir os custos com infraestruturas, caso de rede de abastecimento de água, esgotos etc. Tudo isto fazia sentido, mas meses depois começou a ver-se que era mais fácil deixar o caminho livre à especulação imobiliária e que as intenções não passavam disso mesmo. Cerca de um terço dos rendimentos das Câmaras Municipais são devidos à construção, assim já todos percebem o que estamos a falar...
O PDM de segunda geração não apareceu, a revisão parece que nunca mais veio em termos concretos, ficando pouco mais que intenções, e agora quer-se alterar certos artigos de forma a abrir portas a planos que apenas favorecem o imobiliário e os interesses financeiros. Com isto perde o território, as suas gentes e o seu património.
Pessoalmente considero isto um erro muito grave deste autarca, o qual curiosamente já teve vários problemas com o PDM, tendo tido problemas em várias situações, duas delas relacionadas precisamente com a Reserva Ecológica Nacional. Escapou a perca de mandato, derivado de duas destas situações, ainda não se percebe porquê, abafaram-se os casos.
Outro facto que me parece tremendamente negativo é que estas possíveis alterações,as quais felizmente tiveram mal aceitação de muitos alvaiazerenses, parece que mais não são do que medidas para facilitar por exemplo a construção de um hotel na Serra de Alvaiázere, em plena REN. Isto, além de facilitar a dispersão no território de casas, algo que numa área de risco de incêndio elevada, a muito elevada afigura-se como que um verdadeiro risco para as populações.
Outro facto preocupante é que tenta-se, através destas medidas propostas, ressuscitar várias pedreiras até agora desactivadas, algo que numa área de imenso valor patrimonial e de Rede Natura 2000 é absolutamente inaceitável. Lembro que este autarca já teve muitos problemas quando esteve ao lado de uma empresa de extracção de pedra, em vez de estar ao lado das populações, o caso chegou inclusivamente ao Nós por Cá, da SIC.
Este autarca não é o único a cometer estes erros, mas é o que estando à menos tempo no cargo já mais danos causou em termos de integridade do território, no que se refere às políticas de desenvolvimento territorial. Facto perturbador é que este autarca, quando questionado sobre as críticas que lhe são feitas, além de nunca as aceitar, refere que quem as faz é impedidor do desenvolvimento. Falta a cultura democrática a este autarca.
Em Outubro irei falar da ideia deste autarca em construir um hotel numa área protegida (Rede Natura 2000), em Reserva Ecológica Nacional e curiosamente numa área onde existe um monumento a dois aviadores falecidos na Serra de Alvaiázere. Como é possível, mesmo não sabendo sequer se o poderá fazer, que já haja financiamento comunitário? Será isto lógico, normal e aceitável? Para onde vai o ordenamento do território em Alvaiázere?
Os Instrumentos de Gestão Territorial não são bonecos nem marionetas para alguns brincarem ao seu gosto e vontades! Não são instrumentos para utilizar conforme as modas nem mesmo algo para instrumentalizar face a interesses financeiros que se regem em primeiro lugar pelo lucro e não pela integridade e sustentabilidade territorial.

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